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Tens Medo da Dor?

“A morte sorri para todos nós, só mulheres fortes sorriem de volta”






Tenho uma camisola que me aquece nos invernos com esta frase escrita em inglês. É uma citação de um dos meus personagens favoritos de uma das minhas séries favoritas: Lagertha de Vikings. Lagertha não foi só um personagem de uma série, mas uma mulher real na história Viking, uma escudeira, feroz guerreira, mas também uma mulher doce, uma mãe amorosa, cheia de vida e sabedoria.


A série Vikings apaixonou-me não só porque é crua e real, mas também porque nos narra a história de uma família, e como em todas as famílias, a morte e a dor, seja ela emocional ou física estão sempre presentes. A morte e a dor são elementos muito vivos nesta série como na nossa vida. Elementos muito vivos entre esta família de camponeses guerreiros e fascina-me profundamente ver a relação que o coletivo tinha com a morte e a dor.


Para enfrentar a dor e a morte, os guerreiros Vikings tinham a mentalidade de “abraçar a morte como se fosse uma mulher linda”, o que lhes conferia uma força, uma coragem, uma perseverança e destemor tremendos, que lhes permitiu tornarem-se lendários.

Quando se vai para a guerra está-se numa linha muito ténue entre a vida e a morte. As chances de viver são iguais às chances de morrer e o inimigo nunca se deve subestimar.


Quando se vai para o parto, sinto que seja também possa ser do mesmo jeito. O nosso corpo é levado a tal extremo das suas capacidades que a certo momento sentimos que se ficarmos naquela situação mais tempo a vida há de nos fugir pelos poros.


Da mesma forma que o esforço físico é intenso, o esforço espiritual também o é. Os estados mentais por que passamos são uma constante dança entre o mundo espiritual e o mundo físico, por mais que não tenhamos noção disso. É nesse momento que do lugar escondido que é o nosso ventre, onde uma alma encarnou num corpo, trazemos esse corpo com alma para habitar o mundo exterior.


O parto, como a guerra, acontece com dor, suor, sangue e muitas vezes lágrimas. Para mim, isso faz de todas nós guerreiras.


Nenhum guerreiro vai para a guerra sem preparação, por isso prepara-te para o teu parto. Prepara o teu corpo, mas prepara muito mais a tua mente para o que vais enfrentar. Em Ninjutso – a arte marcial que treina ninjas, o primeiro ensinamento é a perda do medo da morte. O treinamento de um bom guerreiro tem de passar pelo mental. Uma mente bem treinada orienta um corpo a fazer maravilhas.

Por isso treina a tua mente, avalia-te e trabalha naquilo que precisa ser trabalhado para o teu grande dia.



Pergunta-te que medos tens que se possam amonstroar diante de ti na hora do parto. Pergunta-te qual é a tua relação com a dor. Pergunta-te o que te dá força, o que te dá coragem. Pergunta-te como a tua mente e o teu corpo reagem perante tenção. Pergunta-te como trabalhar essas quatro perguntas para te preparares para o teu parto. Que fraquezas há dentro de ti que podem ser resolvidas de forma a te fortaleceres? E porque é que essas fraquezas existem? Elas são verdadeiras mesmo ou são mentiras sobre ti mesma que te foste contando ao longo da vida e que não fazem mais do que te sabotar?


Se achas que não és forte o suficiente para aguentar a dor, acredita que isso é uma mentira que te contaste toda a tua vida. És e és! Se não, não terias nascido mulher! Só não sabes o quão forte és ainda. Vai ao longo da tua gravidez treinando-te para suportar a dor porque o suporte da dor não vem do teu corpo, mas sim da tua mente.

Muda a tua mentalidade em relação à dor. Normalmente encaramos a dor como algo mau, como sofrimento. A dor tem um motivo maior: chamar-te a atenção para algo que está errado no teu corpo e precisa de atenção. Já desde aí ela não significa sofrimento, mas sim alerta. Se não sentisses dor, poderias cortar-te profundamente, não notar e esvair-te em sangue até morrer. Não sentir dor é um problema neurológico que é realmente grave. Por isso a dor é útil. Não queiras enxotar a dor, não queiras viver sem dor. Sem ela, psicológica, emocional ou física, nunca sabes se algo não está bem dentro de ti.


Não podia ser formigueiro nem cócegas, porque isso não são coisas que o cérebro reconheça que nos alertam a perigo, muito pelo contrário…


Mas depois tens outro tipo de dor. Aquela dor de quando fazes exercício e os teus músculos se fortalecem, crescem, ganham mais definição, tónus e massa muscular. Essa dor é quase um prazer! É quase um prazer porque a nossa mente sabe que nos está a fazer bem. A nossa perceção dela não é má, por isso não a encaramos mal. Não a encaramos como sofrimento, ficamos satisfeitos porque sabemos que estamos a fazer bem o nosso trabalho de exercitar o corpo e ele nos dá sinais de que vamos chegar ao nosso objetivo.


Com essa mesma mentalidade encara a dor das contrações. Não te deixes acreditar que estás a sofrer, isso é um jogo mental em que não vale a pena cair. É toda uma dor de um músculo a contrair para chegares ao teu objetivo: trazer a criança para o mundo exterior, para os teus braços, para o teu colo. Só que desta vez não és tu a levantar peso contraindo musculatura conscientemente, é o teu corpo a fazer o que ele sabe fazer primitiva e autonomamente. Ao contrário de no ginásio em que decides largar os pesos para descansar quando te apetece, no parto tu vais ter de ouvir o teu corpo para saber quando aproveitar os momentos de descanso.


No ginásio tu contrais músculo e relaxas, mas tu determinas o tempo de relaxe e de contração. No parto também o teu útero vai contrair e relaxar, mas tu não determinas o tempo de relaxe e contração. Tu só tens de te sincronizar com o tempo do teu corpo e aproveitar o momento em que ele relaxa para descansar e te preparares mentalmente para a próxima contração que virá autonomamente quando o teu corpo e o teu bebé estiverem prontos para ela.


Quando ela vem, o teu útero contrai e de cima para baixo empurra o teu bebé para mais perto da saída. Esse processo tem de acontecer devagar, no tempo do teu corpo e do corpo do teu bebé, esses dois corpos têm de se comunicar e adaptar um ao outro, têm de estar em sintonia para que não se traumatizem, para que a passagem seja bem feita, com o mínimo de dano.


Quando sentires a contração vir “abraça-a como se fosse uma mulher linda”.

Não vale a pena lutar contra ela, ela há de vir com a intensidade que o teu corpo decidir que já pode aguentar. Antes mesmo de tu te dares conta de que aguentas já o teu corpo sabe que aguenta, segue a sabedoria dele e entrega-te. Deixa-te levar por essa onda de intensidade, encara como intensidade não como dor e sofrimento, e respira.


Deixa-te entrar na dança da respiração que te pode levar para o transe da mamalândia. Esse é um lugar seguro em que estarás longe do mundo exterior, mas bem dentro de ti, bem conectada contigo mesma, ouvindo o teu corpo e o corpo do teu bebé, sentindo, sendo consciente e apreciando tudo, todo o processo, segundo a segundo, desde um nível de consciência extraordinário. O silêncio, ou um mantra ou som repetitivo à tua volta é precioso. Respira no teu ritmo, sem pressa, permite-te ouvir-te respirar, é poderoso ouvires-te respirar. Deixa a inspiração ser lenta, deixa a expiração levar para fora de ti toda a tenção, todo o medo, todo o resto daquilo que ainda consideras ser dor. Expira pela boca como se fosses um dragão a expirar fogo, solta a tua garganta deixa sair a tua voz, seja num suave gemido, ou num grito de guerra potente. Mas deixa sair todo esse poder de dentro de ti.


Nós não sabemos o quão fortes somos até termos de o ser. E o teu parto te vai provar que és muito mais forte do que pensas. Por isso se tiveres medo da dor do teu parto, põe um propósito na cabeça: emergir dela mais forte do que alguma vez foste, porque é isso que vai acontecer, sim ou sim.


Sara


Photo 1 credit: Lorado

Photo 2 credit: Lagertha, Vikings


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